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Aprendizados na pandemia: caminhos, desafios e possibilidades

Publicado em: 05/01/2021

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Aprendizados na pandemia: caminhos, desafios e possibilidades



 

Por Maria Carolina Tomé

Psicóloga Escolar graduada pela UFMG 
Mestre em Psicologia da Educação pela PUC de São Paulo

 

 

 

 

 

 


Lockdown: fechem tudo, se protejam em casa sem mais abraços! 

A realidade se impôs fulminante diante de nós e tivemos que conhecer uma perspectiva da vida que não conhecíamos. Nunca, em situação alguma tivemos um desafio coletivo tão pungente e tão inesperado. O que fazer? Como lidar com isso? Como viver todos esses sentimentos e circunstâncias complexas à nossa volta?  Como olhar para nossos filhos? Por onde andamos nós nesse turbilhão? 

 

Nas dinâmicas de grupo tão conhecidas, é comum criar cenários fictícios (ora cenários bons, ora cenários bastante desafiadores) nos quais pequenos grupos de pessoas devem resolver situações como se fora real. Mas, eis que nos vemos agora não em uma simulação e sim num estado vivo das coisas, uma espécie de dinâmica de grupo real: uma pandemia, um vírus letal , desconhecido, que nos deixou em  compasso de espera da cura, dentro de nossas casas, dentro de nós mesmos.

 

O impacto chegou a todos: empresas, famílias, na esfera econômica, social, emocional...e não foi diferente na escola. Na escola, agir rápido,  trouxe sanidade institucional, coisa que só foi possível em uma equipe bem orquestrada: com lideranças proativas, capazes de tomar decisões rápidas, pessoas que já entendiam que o futuro bateria  na porta, mas mais do que isso, um equipe que entendeu rapidamente a necessidade de estar perto, de promover acolhimento e de estabelecer diálogo, mesmo estando longe fisicamente.

 

Para as famílias, foi um momento muito difícil. Os filhos em casa, tendo que estudar remotamente, gerou, ao mesmo tempo, a possibilidade de estar mais junto, mas também de estabelecer desafios relacionais no compartilhamento do espaço da casa de maneira harmoniosa, ou não. Experimentar as relações familiares numa nova e extrema conjuntura não foi tarefa fácil. Também foram muitas as angústias com relação à forma como os filhos iriam aprender, num novo formato, tocando diretamente a saúde mental das crianças e jovens...tudo mudou tão de repente, e para aprender o novo foi preciso tempo... hábito e certamente, uma boa dose de habilidade emocional.

 

Podemos dizer o mesmo da equipe da escola: professores, coordenadores, diretores e funcionários, todos tiveram que entrar em contato com uma parte de si que estava esquecida, deixada de lado...engavetada. Antes da pandemia, andávamos como se tomássemos conta da vida, num moto contínuo, éramos eternos. Éramos. Os sentimentos dolorosos, profundos e quase esquecidos emergiram...e para onde olhar, senão para o próprio espelho. Ali, vimos o medo, a tristeza, a angústia , ansiedade...a raiva entre tantos outros sentimentos. Por aqui, não me furto de usar a segunda pessoa do plural, foi um sentimento compartilhado.

 

Nessa perspectiva, ficou clara a necessidade de falar de sentimentos, reconhecê-los, acolhê-los e transformá-los, da dor à oportunidade, de gestar um espaço real e forte, de acolhimento. Compreender o ser humano como aquele que desenvolve consciência daquilo que passa dentro de si e dentro dos outros, que tem olhar para a cidadania, demonstra cuidado, empatia e compromisso com outras pessoas. COMPROMISSO é a palavra que bem representa a escola. Compromisso com a aprendizagem, compromisso com a vida de cada um e compromisso com o compromisso de aprender. 

Cabe lembrar, nessa perspectiva, que nem só de perdas viveram esses dias! Então, quer dizer que sentimos… e isso é bom? Ou isso é ruim? Certamente humano!...e de repente, as crianças  que compreendiam pouco o sentido da escola, começaram a sentir falta dela...dos colegas, a princípio, mas certamente das relações lá estabelecidas...porque aprender vai muito além de adquirir conteúdos...a escola tem como sentido máximo aprender a estar no mundo por meio das nossas relações e do nosso conhecimento. Em tempos de pandemia, a escola ganhou um novo lugar: central, e amoroso na vida das crianças e jovens. A valorização do professor no seu fazer, na condução de sua aula, na metodologia escolhida, na superação de desafio foi outro grande ganho social... esses mestres nunca mais serão olhados da mesma forma. Em suas casas, família e alunos vivenciaram a importância do papel do professor como mediador de ideias, constructos, aprendizagens e acolhimento. 

 

A pandemia se mostrou como o  grande desafio do agora, mas, certamente serão muitos e tão variados os desafios a serem vividos, e para isso, é preciso formar crianças e jovens que tenham propósito (este é outro grande ganho) que desenvolvam autoconhecimento, iniciativa, curiosidade, pensamento crítico, autogerenciamento, capacidade de resolver problemas, que saibam lidar de maneira mais saudável com os próprios sentimentos. Nessa perspectiva, no ano de 2020, com o ensino remoto, o aluno precisou se organizar em tempos e espaços de maneira mais solitária e sem tanta intervenção de adultos, visto que muitos pais estavam trabalhando fora e os professores trabalhavam de maneira remota. Aprender a aprender, a pesquisar, a organizar os tempos de entrega de exercícios foi um avanço importante na vida dos alunos, a autonomia vivida em tempo real.

 

Diante de tudo isso, cada um de nós precisou acessar e desenvolver em si habilidades para lidar com esse temporal: para uns foram a resiliência, a confiança a esperança, a fé; para outros pode ter sido a necessidade de se organizar, para alguns foi o respirar para lidar com a ansiedade de um futuro incerto, todas essas buscas são genuínas, e todas essas buscas são aprendizagens. Uma aprendizagem comportamental que se alia a conteúdos cognitivos (como matemática, ciências e história) e que estão a serviço da formação de uma pessoa, que com seu conhecimento irá transformar realidades. É nesse chão que nossa escola está firmada. É nesse lugar que habita o nosso propósito.