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Mulheres na ciência: um caminho de grandes desafios

Publicado em: 31/03/2021

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Mulheres na ciência: um caminho de grandes desafios

Por Jovânia Teixeira

Professora, Bióloga, Pedagoga

Especialista em Direitos Humanos e Gestão escolar 

Mestre em Educação

 

 

Ao ser convidada para escrever sobre este tema, muito barulho me causou, ‘será porque existem poucas cadeiras ocupadas por nós?’ Será pelo fato de pouco falar que ocupamos esse lugar?’ ‘Ou por ter sido capturada pela máquina da organização que nos exclui desse lugar?’ Será, será, será....bom, a verdade é que esse ‘barulho’ e esses questionamentos não são ao acaso, menos ainda delirantes (glória se fossem) mas, pensar no lugar social, é organizar espaço, ocupação, territorialidade, ou seja, é promover sujeitos, dar voz à eles, fazer seus discursos valerem, serem ouvidos e ratificados. Para isso, outra pergunta surge, a voz da mulher é ouvida ou escutada? Em ambientes públicos, como nos veem?

 

Para esclarecer esses fatos, é preciso voltar na história e recontar o passado, no século XV (não que antes não tivesse) já tínhamos mulheres que buscavam pela sua notoriedade, sua visibilidade e isso sempre era infrutífero, ou melhor, a repercussão causada pela voz da mulher era determinada por uma sociedade patriarcal, cristã, machista, heteronormativa cujo poder e mando estiveram na posse dos homens, então, o que mudou? Na verdade, pouca coisa já que, se formos observar esse modelo de sociedade se mantém nos dias atuais. Ok, mas não podemos considerar avanços? Temos que comemorar as vitórias, não?  É óbvio que vivemos dos louros das bruxas queimadas na inquisição, das sufragistas da década de 20, das tecelãs estadunidense, das ‘rebeldes’ de todos os tempos, então vamos olhar para o sujeito mulher. 

 

O recorte da história que ‘fraquejou’ as mulheres, as intitulando como frágeis, dóceis, delicadas e amorosas, foi o mesmo instrumento que as enclausurou dentro de suas casas, sendo dona de casas, apenas, por muito e muito tempo esse papel social foi o único possível, não havia escolhas, possibilidades, caminhos ou trajetórias outras, ou casava-se ou seria ‘mal-falada’, quando não desvinculada da casa-grande e posta á rua, para viver miseravelmente ou compor outro cenário constituinte e inerente à sociedade humana, a prostituição. 

 

Não estamos aqui, destituindo ou desagregando as diversas propriedades femininas como a delicadeza, a sutileza ou promovendo juízo de valor aos lugares ocupados, ao contrário, estamos apontando que hoje essas são possibilidades, antes imposições porém, estendemos o olhar para os outros lugares ocupados por nós, o portal da Usp (Universidade de São Paulo) aponta que apenas 40% das cadeiras ocupadas na pesquisa científica são mulheres, a agência Patrícia Galvão registrou que apenas 13% das empresas brasileiras têm como CEOs mulheres, e o IBGE (Instituto de Pesquisa) nos conta que em 2020, 80% da população mundial era mulher, ou seja, somos muitas e ocupamos pouco. 

 

Não há outra forma de olhar para esse cenário senão pela óptica da política, não a política simplista mas, aquela que nos antecede, aquela que detém o poder, que define os instrumentos e mecanismos de dominação, que organiza a sociedade no âmbito cultural, de forma sutil atravessando os sujeitos e os capturando para o lugar das normatividades, do patriarcalismo e das convenções morais, esse é o lugar eficiente de captura para as mulheres. Desapropriá-las de suas potências, ‘guardá-las’ dentro do lar para se ausentarem da competição do mercado de trabalho e assim distanciando-as de todas as esferas de poder e mando, enquanto de forma reinante, estão os homens a se destacarem no cenário social. 

 

 

As mulheres na ciência sempre foram colocadas à margem. As descobertas científicas são fundamentais para o desenvolvimento das sociedades. No entanto, os trabalhos mais reconhecidos são de cientistas homens. Por conta disso, cria-se no imaginário popular que as mulheres nem chegaram a participar da área científica. Listaremos algumas delas, entendendo que muitas tiveram seus nomes apagados das pesquisas ou de forma arquitetada retiradas da mesma. 

 

Hipátia de Alexandria é considerada a primeira mulher matemática da história. Nascida no ano 370, em Alexandria, no Egito, ela desenvolveu pesquisas em astronomia, física e filosofia. Ela foi brutalmente assassinada em 416, após os seus estudos serem descobertos por um grupo de cristãos. A sua pesquisa foi considerada heresia e ela condenada à morte.

 

Nascida em 1888, Matilda Moldenhauer Brooks formou-se na Universidade Harvard e atuou nas áreas de Biologia e Biologia Celular. Ela é bastante lembrada por ter descoberto, em 1932, o antídoto ao envenenamento por monóxido de carbono e cianeto.

 

 

Um médico de sua época escreveu sobre tratamentos bem sucedidos utilizando o composto azul de metileno para tratar envenenamento por cianeto e omitiu o fato da descoberta ter sido realizada por Brooks.

 

Filha do poeta Lorde Byron, Ada Byron é considerada a mãe da computação. Desde muito nova já demonstrava ter grande domínio de diferentes áreas e, aos 17 anos, se comunicava por cartas com Charles Babbage. Ele tentava desenvolver uma máquina analítica foi Ada quem desenvolveu a linguagem para o projeto. As notas escritas por Ada são consideradas o primeiro algoritmo criado para ser usado em um computador, por isso ela é considerada a primeira pessoa a programar em toda a história.

 

Marie Curie nasceu em 1867 foi uma química e física polaca que dedicou a vida nos estudos da radioatividade. Ela foi a pioneira no estudo do tema e sua dedicação era tamanha que a levou a adoecer devido à alta exposição à radiação. Os seus trabalhos são considerados pioneiros no estudo da Radioatividade clássica, além disso, ela descobriu os elementos polônio e rádio. Foi a primeira mulher a ganhar um prêmio Nobel e a primeira pessoa a conquistar duas vezes a premiação. Também foi a primeira mulher a atuar como professora na Universidade de Paris.

 

A história de Katherine Johnson inspirou o filme “Estrelas além do tempo”. Ela precisou quebrar dois preconceitos: de ser mulher na ciência e mulher negra como cientista. Katherine trabalhou na NASA durante 33 anos e ao longo da sua trajetória atuou como computador humano (realizando cálculos), foi promovida a líder de cálculos e participou de equipes com missões para a Lua e Marte.

 

A bioquímica estadunidense Gertrude B. Elion desenvolveu medicamentos utilizados no tratamento de leucemia, AIDS e herpes. Ela também foi responsável pela descoberta de novos princípios de quimioterapia. Devido à sua grande contribuição, ganhou o prêmio Nobel de medicina em 1988.

 

Chien-Shiung Wu nasceu na China e se formou em matemática, mas atuou como pesquisadora na área de física. Se mudou para os Estados Unidos com uma amiga para dar continuidade aos seus estudos. Se especializou e desenvolveu pesquisas no campo da física, tendo sido convidada, em 1944, a participar do Projeto Manhattan, que produziu as primeiras bombas nucleares. Possui pesquisas importantes, tendo como destaque o trabalho sobre fissão nuclear, a criação do Modelo Padrão, e estudo sobre as mudanças moleculares na deformação da hemoglobina causada pela anemia falciforme.

 

            Esta pequena lista e a escrita afetada busca chegar ao leitor como um convite, para se pensar como a sociedade se configura excluindo as possibilidades e alcances a alguns sujeitos, invibializando corpos, silenciando falas, aniquilando vidas. Sendo assim é urgente repensarmos na estruturação da sociedade, o modelo que perpetua e ratifica poder, exclui e desapropria sujeitos das disputas por espaços, por ocupação.                   Abaixo falas de Matilda Moldenhauer Brooks e Chien-Shiung Wu quando, além de terem suas produções científicas contestadas pelos seus gêneros, viveram uma vida de luta, além das pessoais, para serem “aceitas” em um meio marcadamente masculino.   

 

" [...] Parece-me que, na era moderna, quando há tantas mulheres capazes neste país, educadas e treinadas para a liderança, não apenas entre as mulheres, mas também os homens, que é uma decisão reacionária muito curiosa da parte dos que estão no poder, voltar ao costume antigo de considerar um homem como o único capaz de liderar um grupo de mulheres ".

 

“Eu me pergunto se os minúsculos átomos e núcleos, ou os símbolos matemáticos, ou as moléculas de DNA têm qualquer preferência pelo tratamento masculino ou feminino”. 
 

Com isso a luta pelo protagonismo feminino não é de hoje, e de longe está perto de findar, desejamos coragem, persistência e bravura nesta caminhada, que a força e o brilho de nossas ancestrais ecoem em nós.

Pensar em uma sociedade equânime, é pensar em uma sociedade mais ética, mais justa e mais gentil.